quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

Asas e raízes

Sevilha, 2009 © Adelina Silva

“Bendito aquele que consegue dar aos seus filhos asas e raízes”, diz um provérbio.
Precisamos das raízes: existe um lugar no mundo onde nascemos, aprendemos uma língua, descobrimos como nossos antepassados superavam seus problemas. Em um dado momento, passamos a ser responsáveis por este lugar.
Precisamos das asas. Elas nos mostram os horizontes sem fim da imaginação, nos levam até nossos sonhos, nos conduzem a lugares distantes. São as asas que nos permitem conhecer as raízes de nossos semelhantes, e aprender com eles.
Bendito quem tem asas e raízes; e pobre de quem tem apenas um dos dois.


Paulo Coelho, in "Histórias para os pais, filhos, e netos - Volume 2"

sábado, 25 de janeiro de 2014

Rumo a Ítaca

Foz do Lizandro, 2013 © Adelina Silva


Se partires um dia rumo a Ítaca,
faz votos de que o caminho seja longo,
repleto de aventuras, repleto de saber.
Nem Lestrigões nem os Ciclopes
nem o colérico Posídon te intimidem;
eles no teu caminho jamais encontrará
se altivo for teu pensamento, se sutil
emoção teu corpo e teu espírito tocar.
Nem Lestrigões nem os Ciclopes
nem o bravio Posídon hás de ver,
se tu mesmo não os levares dentro da alma,
se tua alma não os puser diante de ti.
(...)

Konstantinos Kaváfis



sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

O dia deu em chuvoso

Sintra, 2013 © Adelina Silva

O dia deu em chuvoso. 
A manhã, contudo, esteve bastante azul. 
O dia deu em chuvoso. 
Desde manhã eu estava um pouco triste. 

Antecipação! Tristeza? Coisa nenhuma? 
Não sei: já ao acordar estava triste. 
O dia deu em chuvoso. 

(...)

Álvaro de Campos, in "Poemas"

quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

Passa, ave, passa...

Póvoa de Varzim, 2014 © Adelina Silva

Antes o vôo da ave, que passa e não deixa rasto, 
Que a passagem do animal, que fica lembrada no chão. 
A ave passa e esquece, e assim deve ser. 
O animal, onde já não está e por isso de nada serve, 
Mostra que já esteve, o que não serve para nada. 
A recordação é uma traição à Natureza, 
Porque a Natureza de ontem não é Natureza. 
O que foi não é nada, e lembrar é não ver. 
Passa, ave, passa, e ensina-me a passar! 


Alberto Caeiro, in "O Guardador de Rebanhos - Poema XLIII" 


quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

Trago boca para comer

Póvoa de Varzim, 2014 © Adelina Silva

(...)
Trago boca para comer
e olhos para desejar.
Com licença, quero passar,
tenho pressa de viver.
Com licença! Com licença!
Que a vida é água a correr.
Venho do fundo do tempo;
não tenho tempo a perder.

(...)

António Gedeão