segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Loira ou Morena?


Porto, 2010 © Adelina Silva

— Na verdade, não há muitas espécies de cerveja, no mundo das idéias. Mas os rótulos perturbam. Uns aparecem com mulher nua, insinuando que o gosto é mais capitoso. Bem, até agora não vi rótulo de cerveja mostrando mulher com tudo de fora, mas deve haver. Mulher se oferecendo está em tudo que é produto industrial, por que não estaria nos sistemas de organização social, como bonificação?

— Você está divagando.

— Estou. Divagar é uma forma de transformar pensamentos em nuvem ou em fumaça de cigarro, fazendo com que eles circulem por aí.

— Ou se percam.

— E se percam. Exatamente. 0 importante não é beber cerveja, é ter a ilusão de que nossa cerveja é a única que presta.

Carlos Drummond de Andrade, in "De notícias & não notícias faz-se a crônica"


domingo, 28 de agosto de 2011

Se a janela se abrisse...


Monção, 2011 © Adelina Silva


Não basta abrir a janela
Para ver os campos e o rio.
Não é bastante não ser cego
Para ver as árvores e as flores.
É preciso também não ter filosofia nenhuma.
Com filosofia não há árvores: há idéias apenas.
Há só cada um de nós, como uma cave.
Há só uma janela fechada, e todo o mundo lá fora;
E um sonho do que se poderia ver se a janela se abrisse,
Que nunca é o que se vê quando se abre a janela.
Alberto Caeiro, in "Poemas Inconjuntos"

quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Vou de Comboio...


Póvoa de Varzim, 2010 © Adelina Silva


Vou de comboio...
Vou
Mecanizado e duro como sou
Neste dia;
- E mesmo assim tu vens, tu me visitas!
Tu ranges nestes ferros e palpitas
Dentro de mim, Poesia!
Miguel Torga, in "Antologia Poética"

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Reacção e|m|n|cadeia


Gondomar, 2010 © Adelina Silva

O cafajeste joga bilhar com a ilusão alheia.

Marcelo Soriano, via Twitter (@euHOJE)

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Uma eterna criança


Magaluf, 2011 © Adelina Silva

A Criança Eterna acompanha-me sempre.
A direcção do meu olhar é o seu dedo apontando.
O meu ouvido atento alegremente a todos os sons
São as cócegas que ele me faz, brincando, nas orelhas.
Alberto Caeiro

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

O espanto dos idiotas


Magaluf, 2011 © Adelina Silva

Retirem da minha frente todos os que olham com o espanto dos idiotas. A minha mais grata paisagem são os meus próprios olhos, mesmo quando olho as coisas.
- Uma vez por todas não escrevo para os que não sabem ler.

António Maria Lisboa, in "Poesia"


terça-feira, 16 de agosto de 2011

Sou uma pequena folha


Andorra, 2011 © Adelina Silva

Geometria que respira errante e ritmada,
varandas verdes, direcções de primavera,
ramos em que se regressa ao espaço azul,
curvas vagarosas, pulsações de uma ordem
composta pelo vento em sinuosas palmas.

Um murmúrio de omissões, um cântico do ócio.
Eu vou contigo, voz silenciosa, voz serena.
Sou uma pequena folha na felicidade do ar.
Durmo desperto, sigo estes meandros volúveis.
É aqui, é aqui que se renova a luz.

António Ramos Rosa, in "Volante Verde"



sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Sonhos Perdidos


Magaluff, 2011 © Adelina Silva

E tu, derradeira geração perdida,
confia-me os teus sonhos de pureza
e cai de borco, que eu chamo-te ao meio-dia...
Alexandre O'Neill


quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Lugares


Palma Nova, 2011 © Adelina Silva

é tão fácil amar lugares
que não existem
Alice Vieira