sábado, 28 de dezembro de 2013

quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

A Porta Aberta

Roma, 2013 © Adelina Silva

A vida não é um corredor reto e tranquilo
que nós percorremos livre e sem empecilhos, 
mas um labirinto de passagens, pelas quais 
nós devemos procurar nosso caminho, 
perdidos e confusos, de vez em quando presos
em um beco sem saída.

Porém, se tivermos fé, uma porta
sempre será aberta para nós, 
não talvez aquela sobre a qual
nós mesmos nunca pensamos, 
mas aquela que definitivamente
se revelará boa para nós.


Archibald Joseph Cronin


sábado, 21 de dezembro de 2013

O Douro bebe as cores da cidade

Porto, 2013 © Adelina Silva

(...)
O Douro bebe as cores da cidade,
sobre elas eu abro o coração
em que te encontras, as colinas
emolduram as raizes que à terra
nos ligam. Para os meus olhos
é momento de pausa: as coisas
que interrogo não resistem à maré,
não dão respostas; perdem-se no mar
como tudo o que a memória não reteve.

(...)

Egito Gonçalves

sábado, 14 de dezembro de 2013

|Im|Possível


Barcelona, 2013 © Adelina Silva

Tudo parece impossível até que seja feito.


Nelson Mandela


sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

The future awaits

Bruxelas, 2013 © Adelina Silva

"A distinção entre passado, presente e futuro é apenas uma ilusão teimosamente persistente."

Albert Einstein

sexta-feira, 29 de novembro de 2013

Olhar devagar

Bruxelas, 2013 © Adelina Silva


Não esqueças sobretudo a armadura
da noite,
a aspereza das estrelas
quando os olhos são recentes
e a gravitação é como um poder
sucinto nas mãos.

(...)

Não esqueças sobretudo de olhar devagar. 

Vasco Gato

domingo, 24 de novembro de 2013

Viver o Hoje

Bruxelas, 2013 © Adelina Silva

O tempo não existe. O que chamamos de tempo é o movimento de evolução das coisas, mas o tempo em si não existe. Ou existe imutável e nele nos transladamos. O tempo passa depressa demais e a vida é tão curta. Então — para que eu não seja engolido pela voracidade das horas e pelas novidades que fazem o tempo passar depressa — eu cultivo um certo tédio. Degusto assim cada detestável minuto. E cultivo também o vazio silêncio da eternidade da espécie. Quero viver muitos minutos num só minuto. Quero me multiplicar para poder abranger até áreas desérticas que dão a idéia de imobilidade eterna. Na eternidade não existe o tempo. Noite e dia são contrários porque são o tempo e o tempo não se divide. De agora em diante o tempo vai ser sempre atual. Hoje é hoje. 

Clarice Lispector, in "Um Sopro de Vida"

quinta-feira, 14 de novembro de 2013

Cheira a mudança

Barcelona, 2013 © Adelina Silva


Num país distante, vivia um povo tranquilo. As ondas sujas e revoltas dos problemas do mundo só muito raramente vinham dar às belas praias quentes e acolhedoras daquele lugar. Isolados de tudo, e orgulhosos de o estarem, os habitantes dedicavam o seu tempo essencilmente ao trabalho, à família, ao ócio e aos amigos.
Porém, havia algum tempo que algo de indefínivel se alterara. As flores não tinham o mesmo perfume e o mel perdera a doçura. (...) A atmosfera tornara-se pesada, como que habitada pelo rugir surdo que anuncia uma forte trovoada. 

Shafique Keshavjee, in "O Rei, o Sábio e o Bobo"

sábado, 9 de novembro de 2013

Regalai os olhos

Bruxelas, 2013 © Adelina Silva

Poemas são como vitrais pintados! 
Se olharmos da praça para a igreja, 
Tudo é escuro e sombrio; 
E é assim que o Senhor Burguês os vê. 
Ficará agastado? — Que lhe preste!... 
E agastado fique toda a vida! 

Mas — vamos! — vinde vós cá para dentro, 
Saudai a sagrada capela! 
De repente tudo é claro de cores: 
Súbito brilham histórias e ornatos; 
Sente-se um presságio neste esplendor nobre; 
Isto, sim, que é pra vós, filhos de Deus! 
Edificai-vos, regalai os olhos! 


Johann Wolfgang von Goethe, in "Poemas" 

quinta-feira, 7 de novembro de 2013

Mar Português

Vila do Conde, 2013 © Adelina Silva


Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram!
Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar!

Fernando Pessoa, in "Mensagem"


domingo, 3 de novembro de 2013

Somente Tu

 Roma, 2013 © Adelina Silva

Ninguém pode construir em teu lugar as pontes que precisarás passar para atravessar o rio da vida, ninguém exceto tu, somente tu. Existem, por certo inúmeras veredas, e pontes, e semideuses que se oferecerão para levar-te do outro lado do rio; mas isso te custaria a tua própria pessoa: tu te hipotecarias e te perderias. Existe no mundo um único caminho, por onde só tu podes passar. Para onde leva? Não perguntes, segue-o.

Nietzsche

quarta-feira, 30 de outubro de 2013

Começo a conhecer-me. Não existo.

Bruxelas, 2013 © Adelina Silva

Começo a conhecer-me. Não existo. 
Sou o intervalo entre o que desejo ser e os outros me fizeram, 
ou metade desse intervalo, porque também há vida ... 
Sou isso, enfim ... 
Apague a luz, feche a porta e deixe de ter barulhos de chinelos no corredor. 
Fique eu no quarto só com o grande sossego de mim mesmo. 
É um universo barato. 


Álvaro de Campo, in "Poemas"


terça-feira, 22 de outubro de 2013

Até ao fundo do mundo

Bruxelas, 2013 © Adelina Silva

(...)
a mais certa certeza de que gosto de ti, como
gostas de mim, até ao fundo do mundo que me deste.

Nuno Júdice

sexta-feira, 18 de outubro de 2013

A desordem do belo

Barcelona, 2013 © Adelina Silva


Quebrar bem cada ladrilho,
sobretudo dos de cor mais forte.
como confetes imprevistos,
atirá-los ao acaso;
fazê-los espalhar-se ao léu,
sem plano algum.
Depois, pregá-los à cal do muro,
como se salpicam estrelas no céu.
Ou seja, ordená-los
na desordem do belo.
(…)
Assim fez Antoni,
arquiteto eterno,
ao visitar, de madrugada,
o banco-rio
do Parque Güell,
a meio caminho
entre Los Caidos e o Coliseu.

José Nêumanne Pinto, in "Barcelona, Borborema"


quinta-feira, 10 de outubro de 2013

Bom Dia!

Bilbao, 2012 © Adelina Silva

(...)
Em todas as ruas te encontro 
em todas as ruas te perco 


Mário Cesariny, in "Pena Capital"


sexta-feira, 4 de outubro de 2013

Palavras para a minha mãe

Bilbao, 2012 © Adelina Silva

mãe, tenho pena. esperei sempre que entendesses 
as palavras que nunca disse e os gestos que nunca fiz. 
sei hoje que apenas esperei, mãe, e esperar não é suficiente. 

pelas palavras que nunca disse, pelos gestos que me pediste 
tanto e eu nunca fui capaz de fazer, quero pedir-te 
desculpa, mãe, e sei que pedir desculpa não é suficiente. 

às vezes, quero dizer-te tantas coisas que não consigo, 
a fotografia em que estou ao teu colo é a fotografia 
mais bonita que tenho, gosto de quando estás feliz. 

lê isto: mãe, amo-te. 

eu sei e tu sabes que poderei sempre fingir que não 
escrevi estas palavras, sim, mãe, hei-de fingir que 
não escrevi estas palavras, e tu hás-de fingir que não 
as leste, somos assim, mãe, mas eu sei e tu sabes. 


José Luís Peixoto, in "A Casa, a Escuridão"

terça-feira, 1 de outubro de 2013

Proporção Áurea

Matosinhos, 2013 © Adelina Silva

(...)
Todos os dígitos seguintes são apenas o começo,
cinco
nove dois
 porque ele nunca termina.

Não se pode capturá-lo seis cinco
três cinco
 com um olhar,

oito nove com o cálculo,
sete
nove
 ou com a imaginação,

nem mesmo três dois três oito
comparando-o de brincadeira
quatro seis com qualquer outra
coisa
dois seis quatro três deste mundo.

(...)


Wislawa Szymborska


quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Lembra-te

Ericeira, 2013 © Adelina Silva

Lembra-te 
que todos os momentos 
que nos coroaram 
todas as estradas 
radiosas que abrimos 
irão achando sem fim 
seu ansioso lugar 
seu botão de florir 
o horizonte 
e que dessa procura 
extenuante e precisa 
não teremos sinal 
senão o de saber 
que irá por onde fomos 
um para o outro 
vividos 


Mário Cesariny, in "Pena Capital"


quinta-feira, 19 de setembro de 2013

O amor não pode esperar

Múrcia, 2013 © Adelina Silva

Quero me casar 

na noite na rua 
no mar ou no céu 
quero me casar. 

Procuro uma noiva 
loura morena preta ou azul 
uma noiva verde uma noiva no ar 
como um passarinho. 
Depressa, que o amor não pode esperar! 

Carlos Drummond de Andrade, in "Alguma Poesia"

segunda-feira, 16 de setembro de 2013

Evolução

Magaluf, 2013 © Adelina Silva

(...)
Rugi, fera talvez, buscando abrigo 
Na caverna que ensombra urze e giesta; 
O, monstro primitivo, ergui a testa 
No limoso paúl, glauco pascigo... 

Hoje sou homem, e na sombra enorme 
Vejo, a meus pés, a escada multiforme, 
Que desce, em espirais, da imensidade... 

Interrogo o infinito e às vezes choro... 
Mas estendendo as mãos no vácuo, adoro 
E aspiro unicamente à liberdade. 


Antero de Quental, in "Sonetos"

quarta-feira, 4 de setembro de 2013

Verdades

Múrcia, 2013 © Adelina Silva

Na maioria das vezes é no escuro que tropeçamos na verdade, esbarramos nela, ou vislumbramos uma imagem ou uma forma que parece corresponder à verdade, muitas vezes sem nos darmos conta disso. Mas a verdade verdadeira é que, na arte do teatro, não há nunca uma verdade única que possamos encontrar. Há muitas. Estas verdades desafiam-se mutuamente, fogem, reflectem-se, ignoram-se, espicaçam-se, são insensíveis umas às outras. Às vezes pensamos que temos a verdade de um momento na mão, e depois ela escapa-se-nos por entre os dedos e desaparece. 

Harold Pinter, in "Discurso de Aceitação do Prémio Nobel"

terça-feira, 3 de setembro de 2013

A calma é tão profunda

San Pedro del Pinatar, 2013 © Adelina Silva


A calma é tão profunda
e abstracta que a sua fórmula não vem nos livros
e não há movimentos que a desenhem
o importante não tem tamanho para caber na televisão.

Gonçalo M. Tavares 

terça-feira, 27 de agosto de 2013

Não são apenas os relógios

Porto, 2009 © Adelina Silva


Também se pode
regressar sem partir. Não são apenas
os relógios que se atrasam, às vezes
é o próprio tempo. E todos
os cuidados são
então necessários. Há sempre
um comboio que rola
a nosso lado sem luzes
e sem freios. E pode
faltar-nos o estribo ou já
não haver lugar
na carruagem da frente.
Albano Martins, in "Escrito a Vermelho"

terça-feira, 20 de agosto de 2013

Juventude

Magaluf, 2013 © Adelina Silva

Lembras-te, Carlos, quando, ao fim do dia, 
Felizes, ambos, íamos nadar 
E em nossa boca a espuma persistia 
Em dar ao Sol o nome do Luar? 

Tudo era fácil, melodioso e longo. 
Aqui e além, um súbito ditongo 
Ecoava em nós certa canção pagã. 

Contudo o azul do mar não tinha fundo 
E o mundo continuava a ser o mundo 
Banhado pela aragem da manhã!...    


Pedro Homem de Mello, in "O Rapaz da Camisola Verde"

sexta-feira, 16 de agosto de 2013

Vaga de 'spuma

Magaluf, 2013 © Adelina Silva


Uma após uma as ondas apressadas
Enrolam o seu verde movimento
E chiam a alva 'spuma
No moreno das praias.

Uma após uma as nuvens vagarosas
Rasgam o seu redondo movimento
E o sol aquece o 'spaço
Do ar entre as nuvens 'scassas.

Indiferente a mim e eu a ela,
A natureza deste dia calmo
Furta pouco ao meu senso
De se esvair o tempo.

Só uma vaga pena inconsequente
Pára um momento à porta da minha alma
E após fitar-me um pouco
Passa, a sorrir de nada.

Ricardo Reis, in "Odes"

segunda-feira, 29 de julho de 2013

Contemplação

Barcelona, 2013 © Adelina Silva


Contemplo o lago mudo
Que uma brisa estremece.
Não sei se penso em tudo
Ou se tudo me esquece.

O lago nada me diz,
Não sinto a brisa mexê-lo
Não sei se sou feliz
Nem se desejo sê-lo.

Trêmulos vincos risonhos
Na água adormecida.
Por que fiz eu dos sonhos
A minha única vida?

Fernando Pessoa, in "Cancioneiro"

terça-feira, 23 de julho de 2013

A Fonte

Roma, 2013 © Adelina Silva

Água a correr na fonte.
Uma quimera líquida que sai
Das entranhas do monte
A saber ao mistério que lá vai…

Pura, Branca, inodora e fria,
Cai numa pedra dura
E desfaz o mistério em melodia…

Miguel Torga

sábado, 20 de julho de 2013

A geometria é o meu lugar

Sintra, 2013 © Adelina Silva

(...)

Todo o silêncio me é música.

Toda a geometria é o meu lugar.

Todos os lugares
acordam no meu peito.

                                                                                                          José Fanha, in "O elogio dos peixes, das pedras e dos simples"